Estava há duas semanas com o olho tremendo. No Instagram, solidariedade: O meu também! Meu olho já não treme mais, cada dia é um músculo diferente. É café! Já pensou em parar de tomar café? Não. Não pensei. Não pensei porque não vou. Se o problema for café, meu olho que se vire. No Google, os diagnósticos: ansiedade, estresse ou uma doença grave. Seja lá o que for, esse tremor nos olhos me acompanha desde as provas de física na adolescência e junto dele uma inabilidade declarada da minha pessoa: não sei descansar. Sinto constantemente que devia estar fazendo alguma coisa que não estou. Que preciso ter uma lista extensa de coisas realizadas no dia. Sinto que tô perdendo tempo, tô desperdiçando as horas, deixando passar o melhor da vida. Antes fosse FOMO - fear of missing out/medo de estar perdendo -, talvez ele fosse menos rígido que minha autocobrança.
Pra além do eterno comer e limpar a cozinha que é a vida adulta, também preciso assistir tal série, terminar tal livro, preciso malhar se não fico louca, preciso me manter criativa, preciso organizar minha vida, preciso trabalhar, preciso de um plano B, C, D, E, talvez um segundo emprego, um fixo. Preciso ir ao mercado. O café está vinte reais, o grão de bico está quinze. Não tá fácil nem pra quem é vegano. Quanto tempo não como tomate… Porque logo na minha vez de ser adulta está tudo tão caótico, tão caro, tão instável?
Enquanto escrevo o olho treme, treme, treme. Passei por essas semanas de tremores sem saber o motivo deles. Enquanto discorro, descubro: me preparei pra um mundo que não existe mais. Quer ansiedade maior do que essa? Eu imaginei que precisaria reajustar algumas expectativas, mas não quase todas elas. Hoje vejo como era a frágil o terreno onde esse país disse que a gente podia sonhar e fazer planos. Escolhi viver da minha sensibilidade em um mundo que caminha passos apressados rumo à indiferença. Sonhei estar em certos espaços que perderam seu prestígio para números. Mergulhei fundo em busca de uma consciência que hoje me sufoca.
A mulher do GPS anuncia, pelo menos uma vez por semana, na minha cabeça: recalculando a rota.
💌 #JanelaIndica: para ouvir.
🎧O podcast Podpah com a Liniker.
Na verdade, eu te indico a Liniker inteira. Há tempos é minha cantora favorita dessa leva MPB contemporânea. Essa entrevista foi um de seus momentos mais desarmados e bonitos. Quanta história, que voz, que mulher! Uma dose de amor palpável, generosa e divertida.
Então na contramão da dose melancólica que joguei na sua caixa de email esse sábado, recomendo que ouça a discografia completa da mesma e depois se deixe apaixonar um pouquinho mais pela gigante de Araraquara ouvindo esse episódio.
🎧O episódio ‘‘Faces da Opressão’’ do podcast Angu de Grilo
Caso queira se aprofundar na reflexão e ansiedade que é pensar o desmonte do país, as aflições que nos consomem a cada semana e a preocupação pelos anos que vem pela frente.
Whoa "descubro: me preparei pra um mundo que não existe mais." essa bateu forte viu...
e nossa, percebo q nem moça do GPS eu tenho. Todo dia eu só acordo e sinto a vibe e vejo oq da pra fazer hahahahhah
pessoas em situação de Brasil be like: